O apoio da UE à Ucrânia é coordenado pelo Grupo de Apoio da Comissão Europeia à Ucrânia (the European Commission’s Support Group for Ukraine, SGUA) e baseia-se em valores partilhados e na fidelidade aos princípios democráticos, nas regras internacionais de direitos humanos para a aplicação da Lei e nas liberdades fundamentais. É por isso que parece razoável que os ucranianos esperem a continuação do apoio europeu. Ainda assim, é imprescindível considerar o perfil político de cada país tendo em consideração alguma heterogeneidade da União Europeia que poderá ter que ser tida em conta. Neste artigo, Helena Sofia da Costa, voluntária da InformNapalm de Portugal, comenta o sistema político português e alguns episódios que podem ser alarmantes. Os ucranianos devem estar cientes desses desafios, a fim de prevenir ou minimizar os aspectos negativos da propaganda russa e combater as consequências da implantação de operações de informação anti-ucranianas.
A guerra híbrida, que nos últimos anos tem sido amplamente mencionada no discurso militar e político, inclui uma variedade de instrumentos e actividades para enfraquecer e desestabilizar um país. Desinformação e notícias falsas e, claro, influência financeira, estão entre as ferramentas de guerra híbridas mais fortes.
O Mundo Lusófono também parece enfrentar certas actividades dissimuladas.
Lusófonos são povos que reconhecem o português como língua oficial e são cerca de 290 milhões de pessoas, de acordo com dados de 2019.
Uma parte da Península Ibérica (incluindo o território de Portugal moderno) foi outrora denominada Lusitânia, o que deu origem ao nome “lusófonos”.
Portugal tem um sistema multipartidário, dos quais 5 são actualmente considerados dominantes:
- Partido Socialista, PS, guiado pelos princípios da social-democracia;
- Partido Social Democrata, PSD, – apesar do nome, é um partido liberal-conservador;
- Bloco de Esquerda, BE, – política de extrema-esquerda, é política mais à esquerda do espectro político de esquerda-direita do que a esquerda política padrão;
- CDS – PP, Centro Democrático e Social – Partido Popular, partido Cristão Democrata;
- Partido Comunista Português, PCP, é um partido político comunista marxista-leninista baseado no centralismo democrático.
Um outro partido, menor em número e influência, é o partido eco-socialista, Partido Ecologista “Os Verdes”, PEV.
O PEV mantém uma ligação próxima com o Partido Comunista Português. Em 1987 entrou nas eleições legislativas e municipais como parte da Coligação Democrática Unitária, que também inclui o PCP. Entre 1983 e 1987, o PEV fez parte da Aliança de Pessoas Unidas, à qual também pertencia o PCP. O PEV é frequentemente criticado por ser um “apêndice” do PCP, e com razão. Desde o início da coligação (Coligação Democrática Unitária, CDU), os partidos membros nunca participaram separadamente em nenhuma eleição.
O domínio da esquerda começou em 1974. Cerca de 300 oficiais autodenominados Movimento das Forças Armadas (MFA), planearam e executaram o golpe de 25 de abril de 1974, que ficou conhecido como Revolução dos Cravos. Como consequência desses eventos, o regime ditatorial herdado de Salazar caiu, o Estado Novo deixou de existir e uma fase inicial moderada-conservadora (de Maio de 1974 a Março de 1975) foi seguida por uma fase de esquerda radical. Os comunistas chegaram ao poder.
Os socialistas chegaram ao poder pela primeira vez em 1976 e ainda estão no poder, mas como nunca houve votos suficientes para chegar ao parlamento, os socialistas estão sempre emparelhados com os comunistas (isto é, em coligação).
Obviamente, a Ucrânia não pode contar com o apoio da esquerda, especialmente dos comunistas.
Vale a pena mencionar o seguinte facto. Depois de o Partido Comunista da Ucrânia ter sido banido por ordem judicial, o Parlamento Português durante uma sessão do Parlamento a 17 de Fevereiro de 2017 condenou as acções das autoridades ucranianas.
O voto contra a decisão ucraniana foi apresentado pelo grupo parlamentar do PCP e aprovado pelos seguintes grupos: PS, PCP, BE e PEV. Dois partidos portugueses, nomeadamente PSD e CDS, apoiaram a já mencionada proibição implementada da actividade do Partido Comunista na Ucrânia, mas continuam a formar a oposição.
Afirma-se no voto de condenação:
- “A Assembleia da República condenou esta sexta-feira a ilegalização do Partido Comunista da Ucrânia e a continuação do estado de guerra no Leste da Europa.
O voto contra a ilegalização dos comunistas ucranianos foi apresentado pela bancada do PCP e aprovado pelas bancadas do PS, PCP, BE e PEV e teve o voto contra de PSD e CDS.
No texto aprovado, lê-se que a lei de 2015 aprovada na Ucrânia que permitiu a ilegalização dos comunistas é antidemocrática e contraria normas e convenções do direito internacional.
Já o voto de condenação ao continuado estado de guerra no Leste europeu foi apresentado pelo PSD, recolheu o apoio de todas as bancadas, exceto do BE e “Os Verdes”.
No voto de condenação, os sociais-democratas defendem o fim dos confrontos no leste da Ucrânia, condenam a violação dos direitos humanos e das liberdades individuais, apelando ainda a uma solução pacífica para a “instauração da paz e segurança” das populações.”
A esquerda, especialmente a extrema esquerda, BE, Bloco de Esquerda, tem difamado repetidamente a Ucrânia. Incluindo os ucranianos que vivem em Portugal e aqueles que vivem fora do país.
Voluntários da Comunidade Internacional InformNapalm já escreveram sobre declarações inadmissíveis dirigidas a ucranianos:
Quotação:
- “Alerta à navegação! Por causa do jogo Portugal-Ucraniana a cidade de Lisboa está infecta de nazis ucranianos e tugas, preparados para a violência. Não andem sozinhos, nem em sítios desprotegidos.”
A captura de ecrã / do perfil de Facebook
Na altura, quem escreveu e divulgou no Facebook as suas palavras, o Sr. Mamadou Ba, era deputado do Parlamento Portugues, do BE de extrema esquerda, um representante do Poder Legislativo português.
Carta aberta ao Parlamento Portuguese escrita pelos ucranianos que residem em Portugal
A propósito, o Sr. Mamadou Ba terminou “repentinamente” o mandato em Novembro do mesmo ano, em 2019, ao cessar a sua actividade como integrante do BE.
A InformNapalm já tinha escrito sobre uma flagrante campanha de desinformação que surgiu em Portugal em 2020. Essas campanhas também foram detectadas nos vários países europeus, o que provavelmente não é um sinal de um processo espontâneo, mas sim de uma “política vertical”.
Aqui surge uma pergunta razoável: o que é que isso tem a ver com a Federação Russa?
Para encontrar uma resposta provável, basta abrir o site oficial da instituição, denominado “Fundação Russkiy Mir” (Mundo Russo) e verificar a lista dos países onde este tem os seus centros, ou agentes, cujas acções são definitivamente coordenadas por Moscovo.
Depois de numerosos precedentes mundiais de tais ocorrências, uma pessoa capaz de pensamento crítico deve ter muito poucas dúvidas de que as embaixadas da Federação Russa em vários países nada mais são do que quartéis-generais de espiões e sabotadores.
Os acontecimentos desagradáveis ocorridos em Lisboa em Junho de 2020 também podem ser analisados nessa perspetiva particular. Todos os meios de comunicação centrais em Portugal discutiram o facto escandaloso: ocorreu uma fuga de dados, divulgação de informação sensível e confidencial, como dados pessoais de opositores ao regime de Putin que vivem em Lisboa, para uma instituição não confiável, nomeadamente, para a embaixada russa em Portugal, da qual Сâmara Municipal de Lisboa é a culpada.
Para um europeu qualquer, especialmente tendo em conta as normas de Lei implementadas na União Europeia, os dados pessoais são um assunto sagrado, para não falar que o deveriam ser para um funcionário de alto nível. Existe uma espécie de “regra tácita”: quem quer que administre a capital, tem potencial para governar o país.
Fernando Medina, presidente da Câmara Municipal de Lisboa, publicamente confirmou que os dados dos activistas civis que participaram nos protestos contra o regime do Kremlin foram enviados a Moscovo. Além disso, um dos manifestantes já é titular de passaporte português, ou seja, o gabinete do autarca, entre outros, entregou à Rússia os dados pessoais de um cidadão português. Num seu comentário público, Medina afirmou que, sendo o presidente da Câmara, com certeza, não sabia nada sobre a violação de dados.
Mas uma auditoria interna da Câmara Municipal de Lisboa indicou que o gabinete de Medina tinha conhecimento da transmissão de dados desde 2018.
Em violação da Lei, a Câmara Municipal liderada por Medina informou a embaixada russa de todas as manifestações contra o Kremlin não só em Lisboa mas também noutras cidades, o que nem sequer é prerrogativa de qualquer câmara municipal.
De acordo com os resultados da auditoria, “as dificuldades de interpretação do protocolo interno obrigaram a Câmara Municipal de Lisboa a enviar informações sobre os organizadores dos protestos políticos à embaixada russa pelo menos 27 vezes”. A informação mais recente fornecida pela auditoria solicitada revelou que a Câmara Municipal de Lisboa partilhou dados pessoais de manifestantes em 52 casos após a entrada em vigor da Lei Europeia de Protecção de Dados.
- Além da embaixada russa, a Câmara Municipal de Lisboa compartilhou dados sobre os manifestantes com as embaixadas de Israel, China e Venezuela.
Por que deveria um presidente da Câmara, a quem é confiada a responsabilidade em nome dos cidadãos, um membro do Partido Socialista (PS) no poder, deixar as coisas acontecerem descontroladamente? No entanto, esta é uma pergunta retórica.
A propósito, o Sr. Medina não parece ter remorsos e vai candidatar-se a um cargo de presidente da Câmara novamente, nas eleições autárquicas, em Setembro de 2021.
Mais uma pergunta retórica é a seguinte: porque é que as autoridades portuguesas não rejeitaram a candidatura de Medina, com base nos resultados da auditoria?
Além disso, há ainda outro facto perturbador. De acordo com as estatísticas dos protestos em Lisboa desde 2013, a maioria dos participantes dos protestos políticos não são russos, mas sim, ucranianos. O facto ainda mais preocupante é que a vasta maioria dos protestos, realizados por ucranianos, tiveram lugar mesmo em frente à embaixada do país agressor em Lisboa.
Quotação: resultados da auditoria. Captura de ecrã.
- “The Lisbon City Hall has not been able yet to ascertain the reasons for the persistence of this practice (*of disclosing personal data), despite the Law changes made in 2013. Meanwhile the practice remains “valid and in effect and was applied to the various requests for manifestation.”
Curiosamente, em 2013, foi emitida uma instrução assinada pelo então autarca da capital, António Costa, que a cidade de Lisboa forneceria dados sobre as manifestações apenas ao Ministério da Administração Interna, MAI, e para o serviço de polícia local. Sob nenhuma circunstância, as embaixadas deveriam ter recebido tais informações. Este axioma não se aplica evidentemente à embaixada russa, que recebe informações em primeira mão.
Os voluntários da InformNapalm não podem deixar de notar mais um detalhe, a saber, um tweet de um proeminente parlamentar, representante da esquerda no Brasil, Alencar Santana Braga, cujas palavras saíram “direto do cartilha russo *”.
(* “Manual russo” é uma metáfora para as diretrizes fornecidas à Fábrica de Trolls russa.)
Captura de ecrã do tweet
- “Muito simbólico! Cruzado de ESQUERDA de um brasileiro negro de Salvador de Bahia sobre o lutador da Ucrânia, país governado por neonazistas de extrema-direita que são ídolos da família Bolsonaro!”
A Embaixada da Ucrânia na República Federativa do Brasil respondeu a este tweet. Tweet de Fabiana Tronenko, embaixatriz
Captura de ecrã do tweet
- “Deputado, o senhor deveria ter vergonha do que esta escrevendo. Não faça trocadilhos com temas sérios. Respeite o esporte brasileiro e ucraniano! Respeite a Ucrânia! O presidente ucraniano, um judeu, nao apoia, e nunca apoiou uma corrente de pensamento tao baixa e letal.”
Todos os acontecimentos acima são o tipo de precedente que deveria ser o foco de
não apenas as pessoas comuns, mas também agências de aplicação da lei de democracias desenvolvidas, instituições judiciais internacionais e missões diplomáticas.
Gostaríamos também de informar que a comunidade voluntária de informação OSINT InformNapalm possui igualmente uma versão do site em português, portanto, as informações sobre os factos de agressão híbrida da Federação Russa contra a Ucrânia e outros países podem ser lidas e partilhadas em várias línguas.
Poderão consultar também:
- Volunteers gathered evidence of 35 Russian military units taking part in the invasion of Crimea
- Teilnehmer von Sea Breeze-2021 erhalten Bücher über russische Aggression auf der Krim und in der Ostukraine
- OSCE PA Representatives Receive Publications on Occupation of Crimea During US Elections Monitoring (PHOTO REPORT)
- Quartéis em vez de resorts de praia. A Rússia transforma a Crimeia ocupada numa base militar
- O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos tomou a primeira decisão no processo “A Ucrânia contra a Rússia” sobre a Crimeia
- Identificação pessoal do comandante do navio Orsk que liderou a tripulação durante a invasão da Crimeia
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